A exposição virtual de artes, Foundations Art Fair, que vai até 8 de Agosto revela talentos emergentes das artes visuais contemporâneas, com destaque para africanos. Ao mesmo tempo que se mostram os nomes, o que chama atenção é a expressão das obras, que traçam os novos e diferentes olhares sobre o mundo a partir da narrativa, paisagem e influências estéticas de africanos.
Os artistas e as obras revelam uma espécie de reconciliação com o espírito africano, a assunção da identidade, os novos dilemas da contemporaneidade quando o mundo “volta” para África. Uma tendência que se mostra também nos novos artistas moçambicanos. Mas já lá vamos.
Enquanto o mundo se debate com novas questões que tem haver com o desenvolvimento tecnológico, em como isso irá afectar o trabalho artístico, as obras de africanos mostram uma outra abordagem, que, parecendo um experimentalismo, é mais um processo de influências globais, que dá expressão aos contextos internos e locais. O preto carregado de algumas telas, as cores cada vez mais quentes, são de um impacto visual que sinaliza um novo capítulo das vivências com a cultura e sociedades locais. Os artistas novos, estarão mais preocupados com a estética, mais do que a procura de terapias de cura em relação a uma história de uma violência associada aos processos de independência que não foram pacíficos. Por isso o preto e o vermelho ainda serão uma combinação conotativa, como é o caso do trabalho da guineense Amy Amalia, que igualmente chama-nos para uma introspecção.
Enquanto isso, a fotografia do zimbabwiano Tatenda Chidora mostra a situação mais recente da pandemia Covid-19, numa abordagem provocativa do seminu de corpos negros com um azul – a cor das máscaras cirúrgicas que sendo as mais baratas, são descartáveis – que cria um impressionante contraste e realça a cor da pele que está mais para carvão do que para as areias castanhas.
Por outro lado, a anatomia humana representada, são os corpos diante do espelho, que quando se vê, se reconhecem, sentem-se eles próprios dentro de um continente em que os assuntos globais têm sempre de ser traduzidos, a assunção de identidade será um debate constante, sobretudo quando vistas as coisas sob o ponto de vista das diásporas africanas. Essa reconciliação ou sentido de pertença, estende-se às tradições e culturas ancestrais, quando se assume que há um conhecimento endógeno, que não é um mundo à parte. As obras de Lewinale Havette, de Serra Leoa, são uma mostra disso.
A mostra patente no 16Neto, em Maputo, de quatro jovens artistas, Nália Agostinho, George Matsimbe, Chris Inácio e Maria Chale, mostram essa paleta de cores, com luminosidade, vibração e presença. Com a predominância do elemento corpo e adereços tradicionais africanos, como brincos, colares que nos remetem às tatuagens makondes, as orelhas furadas à caniço, e outras marcas da estética associada ao primitivismo. São as afrotopias como escreve o filósofo Felwine Sarr, pensar África, sem romantismos nem os exotismos provenientes da ideia de um lugar e gentes sofridas, com as feridas abertas e com um horizonte sombrio. É o olhar a esta certa desordem aos olhos do mundo como uma verdadeira ordem, como um lugar onde o mundo se pode salvar.
Uma nova forma de resolução do conflito de identidade – ao contrário de uma crise. Estes artistas vão pelo caminho que, não sendo novo, é uma quebra estética e em termos de narrativa. Enquanto os mestres procuravam ser expressivos no “resgate” e “reivindicação” dos valores da moçambicanidade, em substituição do que foi subjugado pelo colonialismo, os novos estão dentro dessa identidade que se debate com a globalização e os debates das novas sociedades, os feminismos, a representatividade. Trazem-nos ainda essas obras, as novas paisagens do continente, sobretudo o espaço e os estilos de vida urbanos. Por isso, nesse debate por via das artes visuais, fazem uma confluência de elementos e narrativas, a ideia da modernidade na tradição ou da reinvenção e transformação.
Por isso, nos tempos em que se pode apreciar a feira de arte Foundations Art Fair – e outras –, podemos entender esse panorama actual e aspirar, porque não, que artistas moçambicanos encontrem esses espaços de exposição e intercâmbio destinados ao que de “novo” se cria em África.
Por Eduardo Quive