A longa trajetória do penteado africano como forma de expressão estética, artística ou política

Nascida no continente africano, a arte do cabeleireiro tem importância histórica, estética e simbólica. Passadas de geração em geração e de mãe para filha, as tranças, marias-chiquinhas ou dreadlocks existem desde a antiguidade. Mulheres africanas, profundamente apegadas aos valores tradicionais, sempre cuidaram de seus cabelos e desenvolveram penteados sofisticados com uma estética única. Assim como as escarificações, o penteado africano identifica gênero, idade, etnia, status e gostos pessoais. Estudiosos, missionários, colonos e viajantes perceberam muito cedo a diversidade e riqueza dos penteados africanos. 

Mostrando engenhosidade e criatividade, os africanos também a usaram como instrumento de libertação durante o tráfico de escravos para escapar de seus algozes. O penteado africano também é encontrado na produção artística moderna através das pinturas publicitárias de quiosques de cabeleireiros ou barbeiros ou mesmo na moda afro-americana. 

Actualmente considerada uma das maiores tendências de beleza no mundo, as tranças africanas são uma prática ancestral que vem sendo atualizada. Há vários anos, usando o conceito de sculptural hair, algumas artistas mulheres muito talentosas agarram seus cabelos para criar obras de arte tão belas quanto ricas em significado. Através das redes sociais, elas finalmente expressam estética, artística e politicamente usando seus cabelos.

Entre o desejo de restaurar a confiança nas mulheres, de afirmar a sua identidade ou de denunciar certas questões sociais (igualdade entre mulheres e homens, abolição da mutilação genital feminina, condenação de actos de violência contra as mulheres, apoio ao movimento #Blacklivesmatter), beleza, afro-arte e cultura se entrelaçam e não param de nos surpreender, como mostram os cinco artistas abaixo que se tornaram referências.

Pioneiro da fotografia africana, o nigeriano J.D ‘Okhai Ojeikere dedicou-se a imortalizar os penteados africanos por 40 anos com o desejo de preservá-los organizando-os por tema, como mostra a série Hairstyle, rica em quase mil clicks. Fotografando sistematicamente todos os dias os penteados das mulheres nigerianas na rua, no escritório ou em festas, de costas, por vezes de perfil e mais raramente de frente, para além do projecto estético, a sua obra constitui um património único, tanto antropológico, etnográfico e documental, em estilo minimalista em preto e branco. “Não se trata de copiar ou reproduzir de forma idêntica os penteados das nossas avós que já achavam os de suas avós “antiquados”. Cada geração tem a sua própria inspiração. Queria fotografá-los para guardá-los na memória”, disse.

A jovem designer costa-marfinense Laetitia Ky, cheia de imaginação, aceita o desafio de surpreender seus milhões de assinantes no Instagram e no TikTok todas as semanas, moldando seus cabelos crespos com o mínimo necessário. Com o seu talento faz com o seu cabelo verdadeiras obras de pop art, divertidas e comprometidas, e resgata a cultura afro com uma força, parte integrante de sua feminilidade e identidade. “A ideia surgiu quando me deparei com uma série de fotos antigas mostrando os penteados de mulheres africanas de diferentes tribos que achei lindos, artísticos e realmente impressionantes”, diz ela.

A artista franco-senegalesa Delphine Diallo, em sua série Alteza e Súbditos reais, usa máscaras elaboradas, colares e jóias. Capturadas a cores e em preto e branco, as mulheres são retratadas como atemporais e nobres, usando pintura corporal, jóias e roupas inspiradas na mitologia e em símbolos espirituais para explorar o que o fotógrafo chama de “corpo divino da mulher“.

A artista jamaicana-americana Jessica Spence explora a beleza de mulheres e crianças negras adornadas com tranças finas, torções perfeitas e presilhas de plástico. Por meio de transformações impressionantes, suas pinturas enfatizam mais os cabelos do que o rosto das figuras, focando na sutileza de cada mecha, cuidando de cada pincelada como cuidaria de cada mecha de cabelo. “Inspiradas no cabelo em resposta à discriminação e punição enfrentadas por muitas mulheres e meninas afrodescendentes no trabalho ou na escola, minhas pinturas mostram a beleza e a versatilidade desses penteados e destacam a importância do cabelo na cultura negra, ao mesmo tempo em que destacam suas experiências íntimas e as rotinas da vida diária”, explica ela.

Os impressionantes auto-retratos da fotógrafa e ativista sul-africana Zanele Muholi é facilmente reconhecível. Suas fotografias em preto e branco de alto contraste concentram-se em assuntos únicos vestidos com roupas elaboradas e esculturas feitas de objetos cotidianos mundanos: prendedores de roupa para formar um colar, ervas secas orlando chapéus, rolos de papel higiénico Cascade. Famosa por fotografar assuntos negros queer, ela explora a natureza radical da identidade como forma de celebração e respeito pelo outro. “O trabalho que produzo é para todos”, diz ela.

Por Christine Cibert

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